Insatisfeitos culturais brasileiros
- Thiarles Sosi
- 16 de mai.
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Insatisfeitos culturais brasileiros
Escrito por Thiarles Soares em 16 de Maio de 2025;
Não é raro, sobretudo nos meios digitais, encontrarmos pessoas que se declaram insatisfeitas com a cultura brasileira. Este anseio pouco comum é advindo de várias deficiências que a cultura brasileira vem fornecendo às pessoas.
Esta insatisfação cada vez mais declarada e vocalizada pelo que antes chamaríamos de massas, no conceito de Ortega y Gasset e Hannah Arendt, hoje podemos defini-la como a conscientização, a transição do inconsciente coletivo para o consciente do tecido social, de uma verdadeira nação preocupada pelo alicerce cultural, em suma, a res publica, a coisa pública.
O motivo dessa insatisfação pode ser concatenada pela confrontação cada vez mais presente da cultura de massas contra a cultura popular, ambas possuem algo de comum, são do grande público, da plebe, do povão, mas a cultura de massas é em realidade um produto fantasmagórico que de tanto alarde das mídias e meios sofisticados de comunicação ganharam força e onipresença, criando um mundo paralelo entre o homem real e o virtual. Curiosamente é pelo meio virtual que o homem real encontrará espaço, como que tomado cada vez mais pela consciência social de si e do ambiente em que está, que fomentará a mudança, a revolução cultural pelo que passa o Brasil e o Mundo contemporâneo. Tal fenômeno pouco explorado pode ser definido como a antítese da cultura de massas atomizante de que descrevera Arendt e Ortega y Gasset. Isto porque ao dar vozes aos homens comuns, os meios modernos de comunicação permitiram que opiniões comuns e ocultadas forçadamente pelas mídias de massas fossem supuradas para fora, fazendo com que corações se conectassem a outros corações. A fenomenologia da internet permitiu a criação do que podemos chamar de tribos digitais e nações virtuais, coisa que só ocorreu na história humana no nível real com as antigas tribos das nações históricas, em que os líderes, os generais, os reis, atraíam os varões das tribos e juntos formavam um exército próprio para defender seus interesses. Assim nasceram as primeiras monarquias, como uma família de famílias alicerçadas pelos interesses e ideais comuns. Com o desenvolvimento tecnológico e mesmo intelectual das nações, sobretudo com o advento dos impérios, as nações passaram a perder espaço e foi-se criando um fenômeno estranho e completamente amorfo da morfologia social humana, trata-se do estado. O estado é uma entidade amorfa e mal-definida pelos séculos e que é a desumanização da nação para fins neutrais de interesses. Em tal ambiente, é natural que a cultura de massas crie homens atomizados, e estes defendam seus interesses, mesmo não sabendo quais sejam. O estado surge como antítese da nação. Na Bíblia podemos ver que as nações possuem origem familiar, descendem desta e daquela linhagem dos Filhos de Noé, mas o estado moderno surge de outro estado, e surge a partir de interesses econômicos tão vis quanto supérfluos. O estado é filho do lucro e da usura, enquanto a nação é filha do sangue e do sacrifício. Fenômeno estranho é o retorno das nações mas por meios virtuais, em que homens se conectam com outros homens formando comunidades de comunidades, cidades virtuais de cidades, e nações virtuais de nações que estavam em franca extinção cultural. Estas nações virtuais não são falsas, mas são o reencontro dos homens separados pelo estado e pela cultura de massas.
Entre as nações virtuais, podemos encontrar a do Brasil Conservador, um Brasil insatisfeito com o estado cultural, social e político do Brasil “real”. Onde estão estes brasileiros insatisfeitos nas ruas e nas casas? Eles são tão comuns que são os brasileiros reais, mas que revelam seu rosto, curiosamente, nos meios virtuais. É como se pela internet ganhassem força e coragem para se expressar como realmente pensam no mundo real, mas no mundo real não possuem força e nem voz para fazer-se ouvir. Estes brasileiros andam insatisfeitos com a cultura brasileira e esperam uma curiosa esperança de futuro, alimentada pela internet, ela mesma um objeto de estudo que carece de análise pelos sociológicos. Mas a pergunta que não quer calar é por que os brasileiros são insatisfeitos com a cultura brasileira atual se eles mesmos são os alimentadores dela? A razão para isto pode estar não neles, e nem na cultura de massas, mas num sentimento coletivo que já se perdeu nas brumas do tempo, e que parou no inconsciente coletivo, tornando-se um uso, na terminologia de Gasset, em que os homens adotam tais e tais comportamentos para a convivência social, já não havendo racionalidade em seus atos, mas apenas a aceitação passiva. A esperança de um futuro melhor é alimentada pelo imaginário brasileiro como coisa desejável, mas nunca se conscientizando e racionalizando o que é necessário para se criar este futuro melhor. Como o brasileiro comum não possui instrução do que é uma nação saudável, lança para o eixo mais básico que consegue discernir, que se trata do Estado e da Política. Assim, o brasileiro lança todas as suas queixas e todas as suas esperanças na política e no estado. Quem deve concertar o país deve ser um político e uma política, esquecendo-se, ou melhor. Não sabendo que a política é fruto de uma cultura, e esta é justamente uma conscientização constante do que se quer como sociedade e para o futuro, ou seja, o brasileiro comum está insatisfeito com a cultura, mas acha que é o presidente ou ministro da educação que deve fazer alguma coisa, e não ele mesmo, porque ignora como funciona de fato uma nação.
Mas, nos últimos anos, com o advento das novas mídias e espaços culturais formados por grupos autointitulados conservadores, os brasileiros insatisfeitos com a cultura brasileira foram tomando consciência e verbalizando, a partir da assimilação de ideias destas vozes dissidentes da cultura de massas, o que deseja mudar na cultura. Esta mudança é mais negativa do que positiva, quer dizer, ela diz o que ela não quer mais do que quer. Este brasileiro não tem muita ideia do que ele quer para o futuro, mas ele quer este futuro e sabe que ele não chegará com a cultura atual. Esta insatisfação ainda é como um vislumbre, um dormitar, um leve despertar que ainda não ganhou corpo e voz, não total consciência e nem abrangência de uma revolução cultural, mas sopra aqui e ali ecos de uma esperança cada vez mais encarnada no seio do tecido social, e curiosamente este tecido social verdadeiramente orgânico se realiza pelos meios virtuais.
Em nenhum lugar do mundo, em nenhum país, ocorre com tal força este engajamento que vai conectando corações com corações, comunidades de comunidades, cidades de cidades, e enfim o país inteiro numa revolução cada vez mais barulhenta e vigorosa, como uma onda de um estádio que vai e volta mais forte, com mais barulho e mais força, como ocorre no Brasil. Tal fenômeno ocorre também na América Hispânica, em que os países cada vez mais se conectam, reforçando a identidade hispânica, e sua unidade com a Espanha. Esta conexão entre os países hispânicos se dá pela cultura comum, como se fossem estados de uma mesma nação, de fato, a América Hispânica é um mesmo país com a Espanha. A América Latina sofre dos mesmos males que ocorrem no Brasil, e ambos, como partícipes de uma mesma região e história semelhantes, vão se conectando pouco a pouco numa revolução silenciosa de insatisfeitos com a cultura de massas atual. Eles farão a revolução cultural jamais vista, bastando para isto o estopim e aquele que segurar o canhão.
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