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Cultura brasileira: Entrevista com Rodolfo Melo, editor-chefe do Jornal Cidadania Popular

Foto do escritor: Thiarles SosiThiarles Sosi

Rodolfo Melo é editor do Jornal Cidadania Popular, um jornal cultural em ascensão nas mídias digitais, e responde para nós algumas perguntas sobre si e sobre o trabalho do Jornal cidadania Popular, que vem se mostrando um trabalho crítico da “cultura interna” da nova Direita, bem como da velha e nova Esquerda, cada vez mais importante para o cenário cultural brasileiro atual. Venha saber mais nesta entrevista muito rica em que ele nos concedeu suas análises.

“Fomos os primeiros a meter o dedo nesse vespeiro, numa época em que o marketing e a intelectualidade direitista eram uma só ‘carne’, um só ‘corpo’ e ‘personalidade’, iniciando um movimento de revolução léxica, simbólica e epistêmica, no intuito de consolidarmos, no atual ambiente intelectual (e contra o ambiente intelectual), a prática de criticidade, disrupção e fratura do padrão gramático-simbólico da plataformização informacional.”

Nota: As opiniões e análises aqui emitidas não necessariamente correspondem a opiniões e análises da Casa Editorial da ENA ou do entrevistador, mas são de cunho pessoal do entrevistado. Agradecemos a compreensão e boa leitura!



Fotografia: Rodolfo Melo
Fotografia: Rodolfo Melo

Entrevista com Rodolfo Melo, editor-chefe do Jornal Cidadania Popular


Thiarles Soares (TS): Quero agradecê-lo por aceitar esta entrevista para o nosso editorial. A ideia principal é dar voz para aqueles que estão tomando iniciativa de trabalho cultural relevante para o país, e o consideramos como um deles. Conte-nos um pouco de si, sua infância e juventude.

Rodolfo Melo (RM): Pois bem, diria que fazer uma autobiografia, uma reflexão autobiográfica (nos termos do filósofo Eric Voegelin), é uma tarefa árdua, rica e de requinte característico do último estágio da maturidade intelectual (que o estudioso só adquire, como diz o filósofo Olavo de Carvalho, por volta dos 50-60 anos). Todavia, tentarei, na medida do possível, cumprir a tarefa que me foi proposta: contar quem sou. Nasci em João Pessoa, Paraíba. Morei, durante boa parte da minha infância, no sertão paraibano, até regressar, durante a adolescência, à cidade de João Pessoa, onde moro atualmente.


Devo boa parte de minha paixão por livros a minha mãe, que sempre me incentivou a gostar de ler. Quando eu tinha por volta dos dois ou três anos, era quase que uma rotina diária lermos as histórias infantis clássicas (como Peter Pan, Alibaba, Três Porquinhos, Aladdin, Chapeuzinho, etc), de modo que eu só pude despertar, tempos depois, um desejo pela vida intelectual, porque a minha mãe provocou, desde a minha tenra infância, uma memória afetiva-literária.

Atualmente, sou pesquisador, com ênfase na filosofia carvalhiana (Olavo de Carvalho) e teoria marxiana (marxologia), e editor-chefe do Jornal Cidadania Popular. Dedico-me também ao estudo da metodologia de pesquisa científica. Venho de formação jurídica, a qual, após ter trancado o curso durante um longo período (por motivos que explicarei mais à frente), decidi retomá-la. Sou discípulo e estudioso do filósofo Olavo de Carvalho, a quem devo tudo o que intelectualmente sou e serei um dia.


Dizer meramente que sou casado seria como tentar reduzir a completude do meu ser numa casca verbal sem vida, o que, obviamente, é impossível. Não tenho apenas uma esposa, mas um presente que Deus colocou em minha vida; ela é o meu acalento, mesmo quando toda a esperança se esvai; o farol que me guia pela tenebrosa tempestade e o calor que resplandece todo o meu ser. Parafraseando o anime “Darling in the Franxx”, a minha esposa é o meu par de ‘asas’, sem o qual eu não só não consigo ‘voar’, como também andar.


TS: Quando se deparou com o mundo da cultura e decidiu ingressar-se nela?


RM: Bem, primeiro temos que diferenciar quatro momentos ou etapas de uma vida intelectual. Deixo claro que não existe separação entre a vida intelectual e vida filosófica, senão de ordem (nos termos do filósofo Xavier Zubiri), sendo a vida filosófica o estágio de assunção aprimorada da evolução ou sucepção (nos termos do filósofo Mário Ferreira dos Santos) intelectual. Assim, a vida filosófica implica, de modo necessário, a vida intelectual, enquanto que a vida intelectual, embora seja essencialmente e constitutivamente uma proposta que busca pela vida filosófica, pode ou não alcançar um filosofar.


Por conseguinte, a primeira etapa da vida intelectual é, pois, o mero ato de ingresso na vida de estudos; para o ingresso na segunda etapa, o estudioso, uma vez que busca se elevar ao patamar do mundo da cultura (status quaestionis), tem de passar por um certo grau ou estágio de maturação, enriquecimento e desenvolvimento; já o ingresso na terceira etapa acontece com a evolução da vida intelectual, isto é, o processo possível de atualização das máximas possibilidades intelectuais do estudioso; e, por fim, a assunção ou integração (na terminologia do filósofo Mário Ferreira dos Santos) da vida filosófica, isto é, o salto das máximas possibilidades intelectuais para um ciclo evolutivo de síntese, de uma nova forma.


Estabelecido esse breve parâmetro epistemológico da vida intelectual, posso, então, dizer que foi no ano de 2016, ao conhecer o filósofo Olavo de Carvalho, que ingressei na vida de estudos. Nesse mesmo ano, comecei a acompanhar, motivado pelo “boom político” que o Impeachment de Dilma havia ocasionado, as entrevistas que Olavo concedeu a Brasil Paralelo, bem como a estudar os cursos “Política e Cultura no Brasil” e “Guerra Cultural: história e estratégias”, de Olavo. Acredito que boa parte da terceira geração de alunos do Olavo ingressou na vida de estudos motivada, de algum modo, pela quebra da hegemonia política-intelectual brasileira (ou, dito de outro modo, pelo embate sócio-político daquela época).


Posso dizer, então, que não fujo muito a regra. Como mencionei, quando o processo de Impeachment foi colocado em votação, eu estava na faculdade de Direito. Era uma época em que posições, cosmovisões, correntes e projetos ideológicos eclodiam, fervilhando um imenso ‘caldeirão’ de debates. Se, de um lado, colegas e professores ecoavam as teses do processo constitucional de Impeachment, do outro, um número ainda mais numeroso gritava a tese de golpe institucional. Quando ingressei na universidade, eu já tinha, como a maioria dos jovens de minha época, uma certa cosmovisão de esquerda. Ao longo dos anos, certos acontecimentos provocaram algumas fissuras no meu espectro político.


Em meio ao caos, confusão e barulho que a politização da universidade estava provocando, aconteceu comigo o caminho oposto do que a Imbecilidade Coletiva da direita tanto acusa a universidade: doutrinar alunos. Sim, existia, de fato, uma corrente majoritária e barulhenta, mas a atmosfera de combate que estava presente naquele ambiente me fez entender que eu não sabia onde estava, não sabia o que estava acontecendo e, em suma, não sabia nada sobre o que eu acreditava ou mesmo se eu realmente acreditava naquilo que defendia.


Isso me colocou diante de uma situação similar a circunstância que o filósofo Olavo de Carvalho vivenciou no período da juventude. Eu queria, realmente e verdadeiramente, entender o que estava se passando. Eu queria saber quem eu era, no que eu realmente acreditava e por qual razão acreditava. Eu me vi, então, diante de um dilema. Decidi que, ao invés de dar ouvidos à barulheira, eu tinha de estudar.


Como todo iniciante da época, acabei me deparando com os vídeos de Nando Moura e Terça Livre, até chegar no Congresso da Brasil Paralelo, no qual conheci Olavo. Parando para pensar, é um tanto triste notar que, apesar do enorme potencial de capital simbólico (termo do sociólogo marxiano Pierre Bourdieu), essas iniciativas foram engolidas pela plataformização informacional de mercado. Bem, deixemos para falar desse assunto um pouco mais à frente.


Quando comecei a assistir as entrevistas e vídeos de Olavo, a minha cosmovisão já havia mudado radicalmente, levando-me, pois, a leitura da obra “Desinformação”, de Ion Mihai Pacepa, e da obra “Reflexões sobre a revolução na França”, de Edmund Burke. Por recomendação do Olavo, comecei a estudar (de modo concomitante com os cursos já mencionados) as obras “A Imaginação Dialética”, do filósofo e historiador marxiano Martin Jay, e o “O ópio dos intelectuais”, do sociólogo marxólogo Raymond Aron. Esses dois autores (juntos, obviamente, do Olavo) foram os responsáveis por virar a chave da minha formação intelectual, uma vez que abriram o panorama ou horizonte daquilo que é, atualmente, um dos meus eixos fundamentais de pesquisa: problematizar uma metodologia marxóloga enquanto ontologização do problema marxiano.

A obra de Jay me mostrou que o Instituto de Pesquisas Sociais (Escola de Frankfurt) era algo imensamente mais complexo do que o meio direitista “entendia”. Cada vez que relia “A imaginação dialética”, compreendia o quanto eu estava abaixo da discussão. Isso me fez entender que, para conseguir, ao menos, enxergar a discussão proposta por filósofos do nível de Horkheimer, Marcuse, Adorno, Fromm, Benjamin, eu teria de subir vários e vários degraus.


Caso quisesse compreender o objeto do qual eles estavam versando, e como isso havia determinado a minha situação e cosmovisão, eu teria não só de subir degraus, mas também de enriquecer, elevar e desenvolver o meu nível ou estágio intelectual, até o ponto de alcançar o estágio das contradições e tensões que permearam as problemáticas e experiências daqueles filósofos. Assim, ficou claro que eu não podia me satisfazer com aquele degrau, com aquele estágio ou nível de iniciante.


Eu tinha de me formar como pesquisador, ou seja, formular e desenvolver um estágio de pesquisa suficiente para dar conta da (i) pergunta que os havia motivado ou provocado, do (ii) método ou experiência pela qual processaram a investigação da pergunta, da (iii) problematização estrutural das problemáticas do método, e, por fim, do (iv) referente real daquele objeto. Por sua vez, o livro do Aron levou-me até a sua outra monumental obra (“O marxismo de Marx”), na qual ele problematiza Marx e a obra marxiana, classificando-a desde uma questão científica de estudo (marxologia).


Então, eu tinha, de um lado, as aulas, livros, apostilas e indicações de Olavo de Carvalho, e, do outro, a leitura da obra marxiana de Jay, bem como da marxologia de Aron. Esses foram, basicamente, os alicerces que constituíram a transição da minha vida de estudos para o processo da minha vida intelectual, a qual tem a dialética simbólica-numérica, do filósofo Mário Ferreira dos Santos, como referente criteriológico.


Como disse anteriormente, optei, no ano de 2018, pelo trancamento do curso de Direito. Mencionei também que, ao contrário da acusação proferida pela Imbecilidade Coletiva da direita, a universidade não havia me doutrinado, mas sim me “empurrado” para o mundo da cultura. Estávamos, naquele ano, em plena corrida eleitoral, e, como não poderia ser diferente, decidi fazer parte do processo. Filiei-me a uma candidatura estadual, ficando incumbido de montar e projetar as propostas de campanha.


Conforme os meus estudos apresentavam certos estágios de desenvolvimentos e maturações de questões, isso acabava se refletindo também na proposta de campanha. Comecei, pois, a entender por qual motivo Olavo insistia tanto em dizer que a formação, por meio da produção de uma Alta Cultura, de uma elite intelectual era a condição fundamental para consolidar qualquer programa político.


Decorrente disso, tornava-se cada vez mais nítido que o problema da universidade não era a ideologização ou a politização, mas, ao contrário, a tecnificação profissional. O problema não estava naquela barulheira sobre “golpe” ou “Impeachment”, mas sim no fato daquela disputa só existir devido a um alto grau de polarização. Quer dizer, a universidade, na maior parte do tempo, estava preocupada em formar pessoas para assumirem cargos nos concursos públicos ou ingressarem no mercado dos escritórios advocatícios.


Os fundamentos jurisdicionais, os fundamentos da Teoria do Direito e a própria pergunta pelo que é o direito (tarefa que incumbe a Ciência do Direito) estavam distantes do meio universitário. Para mim, ficou claro que, para existir disputas e discussões sobre bibliografias, linhas de pesquisa, metodologias e problematizações, a faculdade de direito tinha de ser, constantemente, instada a altos níveis de polarização política, o que, contudo, desvirtuaria o escopo da discussão intelectual séria.


Comecei, pois, a perceber que aquele ambiente era como uma gigantesca repartição, cujo fim seria formar profissionalmente juristas para ocuparem postos técnicos-burocráticos no mercado de trabalho. Isso levou-me, então, a decisão de trancar o curso e tentar realizar a máxima evolução possível do meu patamar intelectual. Afastei-me da política e debrucei-me sobre a obra filosófica de Mário Ferreira dos Santos e Olavo de Carvalho, além da marxologia de Aron.


Seguindo a proposta pedagógica-cultural de Olavo, dediquei-me também ao estudo dos professores marxianos que estavam silenciosamente dentro da academia transmitindo metodologias e formando toda uma geração de intelectuais marxianos. Foi neste momento que me dei conta de que a academia comportava discussões, métodos e pesquisas que a nossa intelectualidade deveria não só conhecer, como também problematizar.


Ora, se a proposta pedagógica-cultural de Olavo era formar uma geração de alunos capazes de ocupar, por meio de produções de ‘peso’, as sessões das prateleiras das livrarias, bem como de retirar do espaço público as produções hegemônicas da academia, a nossa intelectualidade tinha de conhecer a arma do adversário, escrutiná-la e problematizá-la, ou seja, extrair o método e rigor de pesquisa dos muros acadêmicos, de modo a tensionar a sua estreiteza e limitação inerente.

Dessa forma, entendi que a nossa intelectualidade poderia se inspirar, em alguma medida, no projeto do Instituto de Pesquisas Sociais (Escola de Frankfurt), quer dizer, levar a produção acadêmica a sério, ao ponto de, sondando as deficiências, contradições e vícios que a permeiam, incorporá-las numa outra óptica de problematização. Assim, para derrotar a atual intelectualidade pública, fazia-se necessário elevar e equacionar, por meio do rigor e metodologia de pesquisa adversária, a nossa discussão, questões e problematizações.


Em vista disso, notei que o trabalho de nossa intelectualidade, além de não ocupar espaço nas prateleiras das livrarias, não conseguia realocar os nossos mestres no cenário do debate público e, por conseguinte, formar uma nova leva de pesquisadores ou estudiosos. Os nossos autores (como Mário Ferreira dos Santos, Miguel Reale, Guerreiros Ramos, Gilberto Freyre, Vicente Ferreira da Silva, João Camilo de Oliveira Torres, etc ) só tinham, e isso quando tinham, algum espaço em certos estudos acadêmicos avulsos.


Havia, por exemplo, apenas 4 pesquisas sobre a filosofia ferreiriana, bem como 4 pesquisas sobre a filosofia realiana (situação que permitia aos acadêmicos marxianos detratarem Miguel Reale como integralista e fascista). Entendi, pois, que, para formar uma produção capaz de ocupar espaços, era necessário realocar as metodologias de nossos autores no debate público, permitindo-lhes ocupar espaço na produção acadêmica. A partir deste momento, decidi que era a hora de voltar ao curso de Direito e tentar produzir uma pesquisa que pudesse realocar a linha filosófica realiana na academia.


TS: Quem é Olavo de Carvalho para você? Que peso ele tem na sua formação cultural?


RM: Pois bem, o filósofo Olavo de Carvalho é, como mencionado, aquele a quem devo tudo o que intelectualmente sou e serei um dia. Acrescente-se que Olavo é também o maior filósofo do século XXI, tendo em vista que ele estabeleceu e consolidou os pilares das questões filosóficas seminais do nosso século, de tal forma que todo o debate ou formulação filosófica atual terá de, necessariamente, passar pelas questões, linhas de pesquisa, conceitos gerais de exame e problemáticas metodológicas que foram arvoradas ou transmitidas por Olavo de Carvalho.

O que chamo, por exemplo, de epistemologia filosófica carvalhiana é, pois, a definição e caracterização condicionante de qualquer ato ou prática filosófica, quer dizer, é a formulação apodítica-fundante do filosofar, sem a qual não existe filosofia (seja ela voegeliana, ferreiriana, kantiana, zubiriana, lukacsiana, meszariana, sartriana, etc). Ademais, Olavo também edificou e problematizou a fenomenologia da consciência enquanto parâmetro estrutural do método filosófico. Se o filosofar, para se denominar como filosofia, tem de, necessariamente, cumprir os requisitos de uma epistemologia filosófica, a ferramenta metodológica do filósofo é a atividade (a estrutura) de sua própria consciência.


Olavo ainda foi o responsável por fundamentar uma metodologia estruturante e determinante das possibilidades do conhecimento e saber científico, que eu classifico como epistemologia científica. Poderíamos falar ainda de diversas outras problemáticas da filosofia carvalhiana, como, por exemplo, a ontologia do ser, metafísica da ordem, ontologia axio-antropológica, metafísica do ser, ontologia tipológica da psique humana, fenomenologia antropraxeológica, epistemopatologia ontológica, gnosiopatologia histórica-metafísica, etc. Destaco que todas essas classificações estão sendo formalizadas e estudadas pelo Jornal Cidadania Popular, local onde o leitor interessado pode encontrar o desenvolvimento dessas (e de outras) pesquisas.


Isto posto, a importância de Olavo de Carvalho na minha formação cultural é, ressalvadas as devidas proporções, a mesma que o filósofo Ortega y Gasset teve na formação filosófica de Xavier Zubiri, que Platão teve na formação filosófica de Aristóteles, ou que o filósofo marxiano György Lukács teve na formação filosófica de István Mészáros. Isso significa dizer que toda a minha atividade intelectual, na medida em que é formada, permeada e envolvida pela prática filosófica de Olavo de Carvalho, objetiva aprimorar e aprofundar as problemáticas da experiência e método filosófico carvalhiano.


Sim, Olavo foi um gigante (capaz de dialogar, de igual para igual, com Mário Ferreira dos Santos, Eric Voegelin, Xavier Zubiri, Louis Lavelle, etc), e teve vários níveis de importância, desde a abertura de um novo panorama bibliográfico, passando pela quebra da hegemonia intelectual, até as análises sociopolíticas assertivas. Todavia, esses são elementos secundários que circundam o filósofo Olavo de Carvalho, e que, portanto, devem ser lidos e compreendidos por meio do princípio unificante, que é a prática filosófica de Olavo de Carvalho.


TS: Qual é o propósito do Jornal Cidadania Popular?


RM: Pois bem, o Jornal Cidadania Popular surge de um incômodo, de uma percepção que, no ano de 2020, eu tive. Desde aquele tempo, eu notei que a aversão e ojeriza pela pesquisa era algo comum e corrente na intelectualidade direitista. Notei que a intelectualidade pública da direita não desprezava somente as pesquisas produzidas pela universidade, mas também a ideia mesma de pesquisa e trabalho escrito rigoroso. Comecei a perceber que, embora Olavo tivesse fornecido toda uma imensidão bibliográfica, os maiores espíritos da época (Alta Cultura) não estavam sendo pesquisados ou trabalhados.


A intelectualidade falava de Mário Ferreira dos Santos, mesmo que não escrevesse nada sobre a filosofia de Mário Ferreira dos Santos; falava de Eric Voegelin, mas não escrevia nada sobre a filosofia de Eric Voegelin (ou, pelo menos, sobre sua ciência política). Por sua vez, filósofos como Miguel Reale e Vicente Ferreira da Silva (que foram responsáveis por criar a Revista Brasileira de Filosofia, um dos maiores núcleos intelectuais do século XX, a qual coligou e reuniu toda a ‘nata’ intelectual da época) não eram sequer mencionados no meio intelectual direitista.


Isso começou a me causar um profundo desconforto. Ora, a proposta cultural de Olavo era ser a ponte geracional que ligaria a nossa geração com o espírito de ouro da geração passada. Como poderia, então, haver um contato ou diálogo geracional se nossos mestres (Mário Ferreira, Vicente Ferreira, Miguel Reale, Gilberto Freyre, Guerreiro Ramos, Louis Lavelle, Eric Voegelin, Xavier Zubiri, etc) não estavam presentes na dita produção da intelectualidade direitista? Se, naquela época, eu ainda não compreendia que aquilo era uma consequência do que, atualmente, teorizo como “plataformização lógica-informacional” do ambiente intelectual, um alerta se acendia.

Movido por este impulso, por esta inquietação (como diz o filósofo Farias Brito),bdecidi, no ano de 2021, fundar o Jornal Cidadania Popular. A ideia inicial era espelhar, na medida do possível, o Mídia Sem Máscara, jornal que foi fundado por Olavo. Ou seja, o Jornal Cidadania tentaria ser um jornal que, através de articulistas especializados, comunicava-se, desde as mais diversas áreas, com a população. A proposta do Jornal Cidadania era ser um meio de discussão, florescimento e desenvolvimento de ideias. O Jornal nasceu com o propósito de convocar os aspirantes a vida intelectual, assim como os estudiosos anônimos, para dialogarem, escreverem e, mediante a formação e maturação das divergências de áreas, perspectivas e métodos, aprimorarem-se.

Como mencionei, a obra de Jay fez, desde o início, parte da minha trajetória de estudos. Sendo assim, era natural que o projeto frankfurtiano (do Instituto de Pesquisas Sociais) fosse, em certa medida, uma fonte de inspiração (tal como Olavo de Carvalho entendia a Escola de Frankfurt, isto é, um tipo de iniciativa que, sendo independente de qualquer organização ou universidade, investigava o que quisesse, sem prestar satisfações a regulamentos limitantes ou a quadros institucionais).


Em vista disso, o Jornal baseou-se num certo escopo ou linha metodológica frankfurtiana, quer dizer, desenvolver “contradições fecundas entre homens de ciência”, os quais, embora “guiados por concepções e métodos diferentes”, seriam “guiados por uma concepção de conjunto”, a qual seria “o motor do trabalho científico” (Wiggershaus, 2002).


Um Jornal cultural, na visão do Olavo, era uma espécie de suplemento literário, do antigo Estadão. Para Olavo, a destruição da Alta Cultura começou no exato momento em que a mídia deixou de ser o canal de comunicação que refletia as discussões e debates científicos de dado assunto, para tornar-se, ela mesma, o setor determinante da discussão científica. Dessa forma, Olavo compreendia a mídia cultural como um corpo de colaboradores especializados que, acompanhando as novidades das suas respectivas áreas, conseguiriam analisar, “ler” e explicar para a população o que realmente estava se passando na sociedade.


Assim, o itinerário de fundação do Jornal Cidadania Popular estava calcado na visão de que a produção das pesquisas tinha de andar lado a lado com uma linguagem mais acessível, ou seja, apresentar um texto que o cidadão médio, caso quisesse, pudesse entender. Eis que, com o tempo, eu comecei a entender que, na medida em que os autores basilares do nosso campo não estavam presentes na consciência do cenário cultural direitista, tentar simplificar termos, questões, problemáticas e discussões era como escrever no vazio e para o vazio.


Como poderíamos resumir ou sintetizar questões, sem termos, primeiro, a base sobre a qual as simplificações se desenvolvem? Como resumir para o leitor o status quaestionis de uma discussão ou temática, sem que tenhamos, antes de tudo, descoberto o próprio status quaestionis? Como, por exemplo, explicar, de modo fácil e acessível, a filosofia carvalhiana se não estabelecermos, antes de qualquer coisa, parâmetros formais que destrincham a maneira como Olavo enfrentou e transmitiu (metodologizou) as problemáticas que vivenciou?


Compreendi, então, que havia um hiato, uma imensa lacuna, de modo que não era possível levar a linguagem do mundo da cultura (status quaestionis) para a linguagem do dia a dia, sob pena de, nesse mesmo ato, destroçar o objeto ou experiência real da questão cultural. Tínhamos de, ao contrário, elevar a linguagem do dia a dia, até o ponto de conseguirmos levá-la ou alçá-la ao mundo da cultura.


O Jornal preservaria a proposta de, mediante debates, divergências, discussões, confrontos e contradições, elaborar os artigos das colunas como degraus de uma escada (as quais o leitor teria de galgar, ao longo do tempo, batente por batente), mas incorporaria, por sua vez, uma nova proposta: ir desenvolvendo (dialetizando) uma pesquisa junto do leitor, ou seja, produzir esboços ou desenhos de pesquisa que se formariam e se corrigiriam na própria produção, ao mesmo tempo em que formariam e corrigiriam o próprio pesquisador, bem como o leitor que as acompanha e estuda.

Se, desde o início, o Jornal Cidadania teve três pilares fundantes (Olavo, Mário e Miguel Reale), era, pois, o momento de preservar dois deles e realçar o terceiro: Olavo de Carvalho. Decorrente disso, percebi que o Jornal Cidadania não tinha de espelhar o Mídia Sem Máscara, mas sim o Curso Online de Filosofia (COF). Se Olavo considerava as notas do Facebook como esboço ou linhas gerais de impressão por meio das quais as aulas descreveriam (rodeando os mais variados e diversos pontos) uma visão focal do objeto, o Jornal Cidadania recusaria a ideia de que a plataforma-informacional seria um meio de “diário”, mas preservaria a abordagem pedagógica carvalhiana.


A partir disso, os artigos do Jornal Cidadania passam a funcionar como etapas de testes ou rascunhos compreensivos que (sondando a questão por meio de mil e uma metodologias, ângulos e perspectivas de abordagem) tentam delinear ou rabiscar visões mais centrais, próprias e apropriadas para analisar as discussões. Da mesma forma que os alunos do COF viam o filósofo filosofando diante deles, os leitores do Jornal veriam o próprio processo de formação dos pesquisadores, isto é, de formulação, confrontação, correção e dialetização de pesquisas.

Portanto, os artigos do Jornal Cidadania são propostos como uma espécie de pré-projeto de Mestrado, uma bússola ou design que, pouco a pouco, vai determinando, contradizendo, corrigindo, revisando e complementando as etapas e decisões pregressas da pesquisa. Produzir pesquisas, através das quais acontece o próprio processo de formação do pesquisador, que, por sua vez, formam questões e discussões para outros estudiosos, é, pois, o objetivo do Jornal Cidadania Popular.


Como mencionei, o método filosófico de Mário Ferreira dos Santos é um dos pilares fundantes do Jornal Cidadania. Nesse sentido, o Jornal foi configurado em colunas hierarquizadas que expressam a Tetractys ou Década Sagrada ferreiriana, isto é, o princípio que rege tudo (composto da soma da unidade, oposição, relação e interatuação ou reciprocidade), que, por sua vez, são divididas em 3 categorias seminais, as quais refletem os 3 tomos da Enciclopédia ferreiriana de Ciências Filosóficas e Sociais.


Em vista disso, a logo do Jornal Cidadania apresenta um homem que, segurando uma tocha, está centralizado dentro de uma esfera (Década), ou seja, um homem que, como ser físico, é símbolo do intelecto divino, na medida em que recebe dele o logos analogante (o ser e a ciência). Essa simbologia do Jornal Cidadania expressa o homem como um ‘eterno’ pesquisador, um ser numa ‘perene’ caminhada para sondar os mistérios da existência (ou, como diz Mário Ferreira dos Santos, que a filosofia “parte do homem, mas que a ele não se submete”).


Por sua vez, o nome Cidadania expressa a variância de posição e atitudes das partes que, ainda que ataquem e defendam umas às outras, são analogadas no mesmo logos. Desse modo, o homem, pela concretude do logos analogante, torna-se cidadão da polis, quer dizer, harmoniza-se com o outro em sua reciprocidade. A antropologia culturalista realiana, fornecendo a principiologia de reunião e acolhimento de todas as tendências de pensamento, todos os esforços criadores daqueles que se dedicam aos problemas filosóficos, ao cultivo da filosofia e da sociedade, completa, pois, o tripé metodológico do Jornal.


Thiarles Soares: Avalia que o jornal é bem compreendido para o seu propósito?


Rodolfo Melo: Acredito que mensurar essa questão é algo um tanto complexo. Como Olavo ensinava, o poder intelectual, em via de regra, é um poder de longuíssima duração, ao ponto do intelectual só conseguir provocar efeitos reais no âmbito cultural ou social depois de sua morte. O historiador Paul - Laurent Assoun, em sua obra “Freud e Nietzsche: semelhanças e dessemelhanças”, verificou que as obras de Nietzsche, enquanto ele estava vivo, não haviam alcançado sequer uma tiragem de mil exemplares, o que, contudo, muda após a morte do filósofo.

Segundo Assoun, dois anos após o falecimento de Nietzsche, foram vendidos onze mil exemplares, soma que, em apenas alguns anos, multiplicou-se por quatro. O filósofo Eric Voegelin, em sua obra “História das Ideias Políticas”, dizia que a história das ideias é composta, basicamente, das “atitudes e pensamentos dos grupos ou pessoas que conseguiram erguer as suas cabeças alto o suficiente para se fazerem ouvir”.


Nesse sentido, acredito que só o tempo dirá se a proposta do Jornal Cidadania conseguiu cumprir tal tarefa. O que posso, pois, afirmar é que o público em geral está, cada vez mais, compreendendo o nosso trabalho (o que queremos fazer e formar), coisa que eu projetava e acreditava que só aconteceria a longo prazo. Como disse, o Jornal Cidadania surge questionando, desde logo, o ambiente da intelectualidade pública direitista.


O que é um intelectual? Qual a função de um intelectual? Quais os requisitos que um intelectual tem de cumprir para se denominar como intelectual? Se os nossos intelectuais não produzem pesquisas problematizando as metodologias, linguagens, linhas de pesquisa, referências e problemáticas dos nossos mestres, como poderiam se denominar intelectuais? Como falar de cultura sem, primeiro, compreender que existe uma continuidade paradigmática entre o nosso tempo e as problematizações de nossos mestres?


Essas perguntas e provocações foram, desde o começo, levantadas pelo Jornal Cidadania, de tal forma que uma crisis (no sentido ferreiriano do termo) se instaura entre o Jornal e o meio intelectual público da direita. Por isso, o Jornal, ao não admitir que o intelectual fosse retratado como uma espécie de cara descolado, descontraído e legal, cujo trabalho seria estabelecer um canal de comunicação com os valores do meio, separava-se drasticamente do padrão que vigorava na intelectualidade direitista.


A vida intelectual não deveria se comunicar com aquilo que o público já valoriza, entende ou conversa, ou seja, não deveria causar conforto, segurança, afeto e intimidade com o meio, mas, ao contrário, provocar os desconfortos, os questionamentos, as contradições e as incertezas que o próprio objeto apresenta, mas que o meio se recusa a discutir ou admitir. Portanto, a proposta do Jornal Cidadania era suprimir (no sentido hegeliano do termo), a partir dos valores cognitivos situados pela vivência intelectual, os valores da existência temporal-social, na qual estamos inseridos.


Seguir essa proposta era, pois, seguir a receita certa para ser rejeitado ou mal compreendido pelo público. Todavia, separando-se da prática corrente do meio, o Jornal foi maturando certos estágios, símbolos e referências de atuação intelectual que, por sua vez, possibilitaram maturar certas chaves incômodas de percepção e intensificação de consciência no ambiente público da direita. Por isso, ainda que o Jornal Cidadania não falasse o que o público queria ouvir e não adocicasse os valores que o público defendia ou aceitava, o apoio e compreensão foram, pouco a pouco, sendo conquistados.


Com o tempo, o público foi compreendo que o nosso trabalho tentava colocar a atuação da intelectualidade direitista sob o jugo do legado e memória cultural de nossos mestres, isto é, dizer o que o ambiente não deseja ouvir ou aceitar, mas que precisava escutar, doa a quem doer, incomode quem incomodar. Ainda temos muito trabalho para realizar e muitas etapas para trilhar, mas, em suma, acredito que o propósito do Jornal está sendo compreendido.


TS: Vimos que seu trabalho nos últimos anos vem ganhando dimensões importantes e polêmicas, porque está a realizar algo semelhante ao que Olavo de Carvalho fizera no Imbecil Coletivo, isto é, estudar casos de personalidades “consagradas” no imaginário da Direita Brasileira contemporânea. Quando se viu diante de tal problema e julgou necessário enfrentá-lo?


RM: Pois bem, como contei, eu já tinha, muito antes de fundar o Jornal, um profundo incômodo com a intelectualidade pública de direita. Era inadmissível que cursos e mais cursos fossem ‘lançados’, sem que a intelectualidade tivesse o menor preparo metodológico ou que tivesse produzido qualquer paradigma de pesquisa. Era inaceitável que nossos mestres não fossem sequer mencionados, estudados ou, muito menos, problematizados, ao ponto dos nossos autores terem sido esquecidos e de nossos intelectuais terem abandonado completamente o intercâmbio intelectual, quer dizer, a formação de pesquisas e discussões capazes de levantar outros intelectuais (os quais, por sua vez, formariam outros intelectuais).


Assim, em meados de 2020, Evandro Pontes, no programa “Olavo tem razão”, da rádio ShockWave, cunhou o termo “Imbecil Coletivo da direita” para se referir a então leva de políticos e atores políticos do meio direitista. Percebi que o termo era interessante, embora carecesse de precisão descritiva. Como Olavo havia corrigido (ao que não me engano, na aula 311 do COF) Janaína Paschoal, o conceito de “Imbecil Coletivo” dizia respeito a uma intelectualidade pública, e não a personagens políticos. Por isso, decidi preservar o termo e elaborar uma descritividade mais precisa e assertiva.


Todavia, decidi realizar este estudo de modo silencioso, uma vez que Olavo optava por não recriminar ou corrigir publicamente os equívocos e absurdos de seus ‘alunos’ mais próximos. Em respeito a essa decisão, eu me abstive de qualquer polêmica pública. O tempo passou e eis que chega um dos dias mais tristes da minha vida: 24 de Janeiro de 2022, data do falecimento de Olavo de Carvalho.


Passado o luto e a tristeza desoladora, busquei dar sugestões a certos ‘alunos’, indicar temas de estudo e incentivar projetos em prol do legado filosófico carvalhiano, além de escrever artigos que convocavam outros estudiosos para o debate em torno da filosofia carvalhiana. Conforme eu realizava estas iniciativas, parecia que o estado calamitoso da intelectualidade pública da direita só se agravava.


Parecia que, após o falecimento de Olavo, a intelectualidade direitista havia dobrado a aposta na imbecilização coletiva. Comecei a entender que, caso não fizesse alguma coisa, essa situação calamitosa não só respingaria no Olavo, que não estava mais aqui para se defender, como também destroçaria o legado do projeto pedagógico-filosófico carvalhiano. Assim, decidi tomar uma posição e me prostrar mortalmente contra a farsa intelectual que a intelectualidade pública da direita se tornara.


Olavo entendia que, para sanear a atmosfera e consciência cultural brasileira, os alunos deveriam retirar os farsantes intelectuais do debate público. Entendi, então, que, antes mesmo de pensar em sanear a cultura como um todo, era preciso realizar o saneamento do nosso próprio meio intelectual. Se não retirássemos os diversos cânceres intelectuais presentes na direita, não haveria qualquer possibilidade de restauração da Alta Cultura ou de formação de uma Elite Intelectual.

Era preciso realizar uma criticidade feroz e ácida, sem empecilhos ou limites, que, em suma, cumprisse o trabalho que Olavo chamava de “trabalho negativo”, ou seja, corroer, corroer e corroer toda a absurdidade presente no debate público. Tal como Olavo havia feito, tínhamos de bater na intelectualidade para corrigir o prumo, tentando, na medida do possível, puxar o intelectual do fundo de sua inconsciência. Para realizar tal tarefa, precisávamos nos opor radicalmente às visões, percepções e valores do meio, o que exigia, portanto, uma linguagem e quadro de questões altamente técnicos e aversos aos padrões da intelectualidade corrente.

Precisávamos, pois, de uma nova gramática (como diz o marxiano Vladimir Safatle) intelectual, de um “alfabeto” que fosse capaz de ‘colidir’ com certas questões, pautar discussões e dissolver outras. Era necessário realizar uma “transição epistemológica” (termo do marxiano Boaventura de Sousa Santos) na representação de tempo-espaço da intelectualidade, a qual foi encontrada problematizando a metodologia sociológica da plataformização do trabalho (do marxiano Ricardo Antunes) para o campo cultural.


Dessa forma, a ideia era transpor o que o marxiano Pierre Bourdieu denominou de “censura e formulação”, quer dizer, a estrutura (capital-informacional) que não somente rege o acesso à expressão e à forma de expressão, como também reprime e exclui qualquer possibilidade de transgressão ao tipo de código linguístico dos produtos de mercado (Bourdieu, 2008).

Se, na época em que Olavo de Carvalho havia escrito o livro “O imbecil coletivo”, o problema era a queda de consciência da intelectualidade acadêmica, a queda de consciência da atual intelectualidade direitista se dava por meio do que chamamos de “plataformização lógica-informacional de mercado”, a qual não somente gestava, comandava e subordinava a produção cultural, mas também engolia e operacionalizava a consciência do intelectual, tornando-a, por sua vez, parte da automatização, circulação e incremento da “máquina informatizada” (na linguagem antunesiana).


Todavia, como estávamos lidando com uma linguagem marxiana, técnica, rigorosa e, sobretudo, totalmente estranha para o espectro direitista, teríamos de proceder invertendo as etapas percorridas pelo Olavo. A obra “O imbecil coletivo” é uma exemplificação descritiva que encerra uma trilogia de análise de uma temática histórica. O quadro ilustrativo da obra surge, portanto, apenas quando a análise já havia sido posta.


Como a crítica à plataforma exigia termos técnicos da teoria marxiana, era inconcebível que o Jornal Cidadania formalizasse, primeiro, a teoria para, em seguida, exemplificar os casos. Se, na década de 90, Olavo estava lidando com as chamadas “vacas sagradas” da academia, estamos lidando, atualmente, com uma máquina-informacional sem freio (na linguagem antunesiana), a qual exerce um poder hegemônico sobre todo o ambiente intelectual, isto é, sobre a ideia mesma do que é o intelecto e a cultura, bem como do que é existir como sujeito.


Isso significa dizer que, no intuito de estabelecer um diálogo disruptor, ou seja, uma linguagem que, embora resumida e sintética, pudesse chegar ao público com uma carga de rigor próprio e apropriado para elevá-los até o nível de complexidade das questões, precisávamos, primeiro, exemplificar os casos, desnudar os intelectuais direitistas que venderam as consciências para a plataforma (sendo, portanto, imbecilizados).


Assim, por meio das ilustrações dos casos, fomos, pouco a pouco, acostumando o público com a tecnicidade da crítica, instigando desconfortos, questionamentos e percepções mais aguçadas, assim como quebrando o padrão de canonização a “não-criticidade” (ao reforço e inserção lógica de produtos em novos dispositivos e demandas-informacionais). As exemplificações críticas tentavam, pois, subverter e denunciar aquilo que Bourdieu denominou de “adesão ao contrato tácito da doxa estabelecida” (Bourdieu, 2008), quer dizer, romper, mediante uma “épochè prática”, a concordância imediata da apreensão e visão social com as representações discursivas estabelecidas.


Antes de equacionarmos a crítica, era impensável, por exemplo, que a intelectualidade direitista e o público pensasse em se posicionar contra a dispositivação (captura e controle) que o marketing provocava no ambiente cultural. Naquela época, tecer qualquer comentário negativo ao marketing ou a lógica de produtos era algo insano e inadmissível, uma vez que o público não somente pensava, vivia e se constituía como sujeito por meio do uso de produtos-informacionais, mas também que a intelectualidade era a plataforma, a qual era, em contrapartida, o ambiente intelectual.


Tentávamos, portanto, estabelecer uma padrão de questionamentos e criticidade que pudesse colocar a intelectualidade direitista sob pressão, de tal forma que, estando encurralada, a doxa e o silêncio censurante seriam quebrados, levando, consequentemente, ao surgimento do discurso ortodoxo (no sentido bordieuiano) que a intelectualidade tentava encobrir e justificar, ou seja, do “princípio de legitimação sobre o qual o discurso se baseia”.


Nesse sentido, resumindo certos temas técnicos de pesquisa num mostruário de casos e fenômenos, queríamos instituir uma luta simbólica, uma gramática crítica, científica e rigorosa como métrica balizadora da produção intelectual, no sentido de, elevando a produção cultural, intensificar o esforço, degrau ou estágio intelectual do público, até o ponto de terem altura e desenvolvimento suficiente para enxergar e discutir as questões dos nossos autores.


Fomos, pois, os primeiros a meter o dedo nesse vespeiro, numa época em que o marketing e a intelectualidade direitista eram uma só ‘carne’, um só ‘corpo’ e ‘personalidade’, iniciando, pois, um movimento de revolução léxica, simbólica e epistêmica, no intuito de consolidarmos, no atual ambiente intelectual (e contra o ambiente intelectual), a prática de criticidade, disrupção e fratura do padrão gramático-simbólico da plataformização informacional.


TS: Quais resultados (preliminares) pode já tirar desta pesquisa? Está decepcionado? Por quê?


RM: De tal sorte, a fase inicial da pesquisa conseguiu problematizar a plataforma como uma gestão e centralização lógica-informacional, a qual converte a lógica de mercado na lógica mesma da existência, de modo que a atividade do intelectual é controlada e organizada enquanto gerenciamento e disponibilização das subjetividades racionais (corporeidade e consciência) para venderem-se (transferirem-se) e enxergarem-se como partes valoradas (úteis) da mercadoria, ou seja, racionalizarem o uso, reexecução (trabalho de expansão) e aplicação do valor-informação (ganho, benefício, vantagem, etc) enquanto constitutivo de vida (de afazeres diários).

A plataforma apropria-se do desejo racional do sujeito, o qual é constituído e reconstituído como sujeito-mercadoria, ou seja, sujeito que só se identifica como sujeito ao reexecutar (trabalhar para) a lógica de conversão e acréscimo (valorização) do produto (informação) para outro produto (informação), e outro, e outro, etc.


A plataformização lógica-informacional de mercado, portanto, racionaliza e produz sujeitos que vivem e pensam através da integração e conversão da concentração lógica de produtos (informações) para a vida diária, que é, por conseguinte, fixada, aprisionada e relacionada à máquina-informacional (estrutura de trocas constantes). Esse é o resumo básico da problemática (a qual ainda será produzida como pesquisa formal), que é, por sua vez, apresentada por meio da crítica e mostruário da Imbecilização Coletiva da direita.


Posso dizer que, até então, os objetivos de nossa proposta crítica estão, gradualmente, sendo cumpridos, uma vez que o próprio ambiente intelectual foi forçado a adotar a criticidade da gramática, aceitando certos postulados, léxicos e questionamentos. Como mencionei, há alguns anos atrás, era impensável que a própria intelectualidade direitista fizesse qualquer menção negativa ao marketing.


Hoje em dia, embora a lógica de evolucionismo sociometabólico da plataforma, para salvaguardar a lógica de produtos, tente sempre reestruturar os elementos da criticidade, inserindo-os, controlando-os e transformando-os numa nova proliferação de demanda-informacional, essa crítica não só é possível, como também está sendo, cada vez mais, realizada, ao ponto da intelectualidade direitista, a partir de uma épochè epistemológica dissolvente, estar criticando a si própria.


TS: Tendo em vista as respostas dadas, podemos notar de fato a formação de um pensamento a uma só vez crítico e em formação, isto é, que almeja expor um problema com toda a complexidade que ele compõe ao longo do tempo. Isto nos lembra o próprio Olavo de Carvalho que disse uma vez que “ter noção do tamanho do problema é o primeiro passo para que se a resolva” (entrevista concedida à Rede Vida, Tribuna Independente, 18 de Abril de 2004). Infelizmente, não vemos este mesmo esforço na maior parte daqueles que ficaram conhecidos como “os alunos de Olavo de Carvalho”, isto é, os portadores de seu legado cultural, sendo mesmo alvo de depreciação por causa de muitos de seus alunos que se comportam de modo “caricatural”. A que você atribui este fenômeno caricatural? Será que o próprio Olavo de Carvalho ao popularizar alguns de seus alunos nas mídias de massas, os induziu à caricatura cultural, sem exigir deles a comprovação concreta de seus trabalhos?


RM: No vídeo “Caminhos críticos para separar Olavo de Carvalho do olavismo”, defendo essa tese crítica. Penso que Olavo tem sim que ser criticado pela falta de correção e rigorosidade pedagógica com os alunos dele (sobretudo com os mais próximos), ou seja, por não ter levado em conta que existe uma tensão inextricável entre a atividade pedagógica e a atividade filosófica. Quer dizer, Olavo, devido a ojeriza que tinha do ensino filosófico acadêmico, entendeu que a relação dele com os alunos não deveria estar calcada ou pautada num rigor corretivo, porque cabia ao próprio aluno ser moralmente responsável pela sua formação intelectual, de tal forma que o que o aluno iria fazer com aquele conhecimento era de responsabilidade do próprio aluno.

Embora tivesse uma visão pedagógica correta, no sentido de afirmar que o aluno só aprende aquilo que realmente quer aprender, aquilo pelo qual ele se interessa profundamente, Olavo não enxergou que a correção que o professor exerce na produção cultural do aluno, diante do próprio aluno, é uma condição necessária para a formação intelectual.


Assim, devido a uma série de fatores, Olavo acabou normalizando um processo outsider de formação intelectual, no qual o balizador da produção cultural dos alunos seria, pois, o interesse intelectual que eles demonstrassem.


Isso causou, pois, inúmeros problemas, dentre os quais a noção de que a revitalização da cultura brasileira se daria não somente mediante um trabalho de peso, mas principalmente mediante a suposta importância genuína que o assunto tinha para a vida do aluno.


Consequentemente, a autoridade intelectual do aluno deixou de ser avaliada pelas linhas de força, discussões ou questões que a produção cultural dele conseguisse formar na história cultural brasileira, passando, por sua vez, a ser avaliada segundo a proximidade, amizade, confiança e afeto que o aluno teve pessoalmente com Olavo, ainda que esse aluno não tivesse a menor capacidade de entender qual era a proposta pedagógica-cultural carvalhiana e, até mesmo, quem era o filósofo Olavo de Carvalho.


Thiarles Soares: Acho importante reforçar essa comparação que você faz com a Escola de Frankfurt, em que o jornal em parte se inspirara. Poderia contar-nos um pouco mais de como esta comparação é importante para entender o movimento cultural em geral? O que é a Escola de Frankfurt e por que ela é um ponto de comparação importante para o fortalecimento de um movimento cultural?


Rodolfo Melo: Explicar o que é o Instituto de Pesquisas Sociais (Escola de Frankfurt), um projeto filosófico-cultural que determinou boa parte da história das ideias do século XX e XXI, exigiria um artigo inteiro ou, até mesmo, um livro. Todavia, tentarei, na medida do possível, fazer um breve resumo histórico da questão. O Instituto surge quando Felix Weil, em 1920, publica o seu doutorado, “Natureza e caminhos da socialização”, “diante de professores que não eram absolutamente socialistas” (Wiggershaus, 2002).


Em 1921, o filósofo marxiano Karl Korsch publicou o doutorado de Weil como último tomo de um programa intitulado “Socialismo Prático”, cujo fim era permitir que intelectuais dotados tivessem uma compreensão correta da natureza do socialismo, bem como a inspiração para realização de projetos socialistas concretos. A partir deste momento, Weil percebeu que precisava “fazer alguma coisa pela teoria marxista”, quer dizer, discuti-la através de uma instituição que conseguisse ir “além das limitações da ciência burguesa e da estreiteza de espírito ideológico do partido”. (Wiggershaus, 2002).


Em 1923, Weil e Korsch, no intuito de proporcionar que as “diferentes tendências do marxismo” tivessem a oportunidade de, discutindo a teoria em conjunto, chegar ao “marxismo verdadeiro e puro”, realizaram um seminário de verão que ficou conhecido como “EMA”, “Primeira Semana Marxista do Trabalho” (que também foi chamada de “encontro marxista de estudantes”), a qual foi “composta apenas de intelectuais, que, em sua maioria, eram doutores”. (Jay, 2008; Wiggershaus, 2002).


Foi então que, em fevereiro de 1923, no intuito de buscar por um “tipo de saber radical que era pouco favorecido pela extrema rigidez hierárquica do sistema universitário vigente”, Weil cria oficialmente o Instituto de Pesquisas Sociais (que foi, contudo, inaugurado apenas em junho de 1924), formulando-o não somente como uma alternativa aos “canais normais da vida universitária”, como também um meio para que certos temas, que eram negligenciados pelo currículo padrão do ensino superior, fossem “estudados com um rigor nunca antes tentado”. (Jay, 2008).


Na medida em que tinha o desejo de fundar o Instituto no “modelo do Instituto Marx-Engels de Moscou”, isto é, um “estado-maior de professores e estudantes” (Wiggershaus, 2002), Weil (a conselho de David Riazanov, diretor do Instituto Marx-Engels) decidiu filiar o Instituto com a de Frankfurt numa aparência “impecavelmente burguesa”, mas formá-lo internamente como um “mosteiro dedicado a pesquisa marxista coletiva” (Stuart, 2018).


Disso, depreende-se que o Instituto é um ponto de comparação importante, uma vez que permite-nos pensar a produção cultural por meio de uma metodologia científica, de pesquisas que buscam pelo saber, pela verificação disciplinar rigorosamente controlada e crítica na escolha de premissas ou abordagens, e, ao mesmo tempo, pensar a proposta pedagógica-cultural carvalhiana (Alta Cultura) enquanto uma vida intelectual que se dá nas “relações sociais da vida real, em sua extensão e totalidade” (Wiggershaus, 2002), “uma delicada orquídea que precisa ser protegida do ambiente furiosamente hostil” (Stuart, 2018) da instrução acadêmica especializada e limitante.

Além disso, o Instituto permite-nos compreender que uma discussão teórica (um levantamento de questões e linhas de pesquisa) entre intelectuais têm primazia num movimento cultural, na medida em que são os intelectuais que continuarão uma memória social, ou seja, problematizarão um paradigma de consciência histórica em torno de uma história de consciência, bem como fomentarão um repertório de divergências e contradições fecundas (como, por exemplo, as divergências entre Carl Grünberg e Max Horkheimer, entre Karl August Wittfogel e Horkheimer, entre Henryk Grossmann, que teve seu pós-doutorado orientado por Grünberg, e Horkheimer, entre Friedrich Pollock e Grossmann, entre Theodor Adorno e Eric Fromm, entre Horkheimer e Fromm, etc), as quais embasarão a formação de outros estudiosos.


TS: Você mencionou autores brasileiros importantes que, na perspectiva do próprio Olavo, tinham uma contribuição ao desenvolvimento de ciência em suas respectivas áreas a nível global. Acha que a situação a que autores como Mário Ferreira dos Santos, Miguel Reale, Otto Maria Carpeaux foram submetidos, poderá ocorrer o mesmo com o próprio Olavo de Carvalho se um trabalho “frankfurtiano” do negativo à direita não ocorrer? E que diria do argumento de que é necessário tolerar o “menos pior” para que o pior não engula tudo o que há?


RM: Na verdade, na medida em que a Imbecilidade Coletiva de olavistas está sociometabolizando (termo do filósofo marxiano István Mészáros) a filosofia de Olavo de Carvalho (diferencio o termo filosofia de Olavo de Carvalho do termo filosofia carvalhiana, tendo em vista que esta última diz respeito aos estudiosos que se dedicam à pesquisa científica da prática filosófica carvalhiana, os quais, portanto, não podem ser plataformizados) numa plataforma de produtos-informacionais, pode-se dizer que, se não efetivarmos um trabalho do negativo, a obra filosófica de Olavo de Carvalho terá um destino ainda pior do que o da obra filosófica de Mário Ferreira dos Santos ou de Miguel Reale.


Embora a filosofia ferreiriana ainda seja (como Olavo dizia) inalcançável para a cultura brasileira, Santos não teve o seu filosofar deturpado ou vilipendiado, mas sim esquecido e posto de lado. Dessa forma, a filosofia ferreiriana pôde preservar a sua terminologia técnica e problemáticas metodológicas, de modo que, ao ser resgatada por Olavo de Carvalho, ela ainda foi, em alguma medida, cercada por estudiosos que a paradigmatizaram cientificamente, preservando, portanto, a estrutura relacional inerente à complexidade do filosofar.


Por sua vez, Reale foi, por duas vezes, reitor da Universidade Estadual de São Paulo (USP), membro da Academia Brasileira de Letras (ABL) e coordenador da comissão responsável pela reforma do Código Civil, além de presidente do Instituto Brasileiro de Filosofia (IBF), onde realizou diversos congressos acadêmicos internacionais. Por isso, embora Reale tenha sido, assim como Santos, posto de lado (como também, em certa medida, detratado), a filosofia realiana é, ainda hoje, respeitada academicamente em países como a Espanha, Portugal e Itália.


Já no que diz respeito à filosofia de Olavo, Sílvio Grimaldo (que foi amigo pessoal de Olavo, ao ponto de não só morar alguns anos com ele, mas também de constar em seu testamento) afirmou que ela resume-se a ter uma “personalidade sincera e autêntica”, a mudar a vida das pessoas ou auxiliar os relacionamentos pessoais e a “pensar soluções para problemas práticos da vida” (grifos meus).


Assim, como pode-se ver, a Imbecilidade Coletiva de olavistas repercute a ideia de que Olavo de Carvalho não era um filósofo, mas sim um produto terapêutico de vida, como, aliás, Grimaldo chegou a ressaltar (no programa “Conexão KGB”): “O que vai ser do pensamento do Olavo? A pergunta está equivocada. A pergunta é o que vai ser de você com tudo isso que o Olavo deixou. É o que você vai fazer, não pela obra do Olavo, mas o que você vai fazer por você mesmo, de que maneira você vai aproveitar isso. O trabalho mais importante do Olavo, a obra do Olavo, é a personalidade de seus alunos, esse é o grande legado do Olavo” (grifos meus).


Decorrente disso, a sociometabolização pela qual a Imbecilidade Coletiva de olavistas plataformiza a filosofia de Olavo de Carvalho impede que as problemáticas de sua prática filosófica, filosofar e obra filosófica sejam formalizadas e parametrizadas, o que destroça, por conseguinte, a filosofia dele. Podemos citar, por exemplo, o próprio conceito de “personalidade”, questão que está intrinsecamente contextualizada pela problemática da ontologia axio-antropológica carvalhiana.


Todavia, o conceito de “personalidade” é esvaziado de sua problemática inerente e convertido numa espécie de “transformação interior” pela qual as “inclinações banais, infantis e mesquinhas” cedem lugar ao “equilíbrio e maturidade”, a “personalidades serenas em meio ao caos”. Não à toa, Allan dos Santos, “aluno” que também chegou a passar algumas temporadas na casa de Olavo, disse (em entrevista dada para o programa do Monark) que: “O professor Olavo de Carvalho é o fundador desse negócio de marketing digital, de vender curso online, isso começou com o professor Olavo de Carvalho”, bem como que “a vida intelectual do professor é uma ferramenta que ele utiliza para levar as pessoas para Deus” (entrevista dada para o documentário “Olavo tem razão”).

Em Março de 2023, Allan fez um post no Instagram afirmando que “O Olavo analista político era uma camada infinitamente inferior em comparação ao filósofo, mas até o filósofo era inferior ao Olavo marido da Roxane” (grifos meus). Dessa forma, os alunos que viveram com o filósofo Olavo de Carvalho, que gozam da ‘autoridade’ de terem convivido pessoalmente com Olavo de Carvalho, não só destroçam a filosofia dele, como também reduzem o filósofo a (quando muito) um mero professor ginasiano de filosofia, um cara que conseguiu facilitar uma expressão simplificada de filósofos complexos e técnicos, como também que abriu, mudando as “recomendações de livros e condutas morais”, “espaço para novas ideias e autores”, quebrando, por sua vez, uma hegemonia política-intelectual de esquerda.


Paulo Briguet, que foi amigo pessoal de Olavo, disse (em entrevista dada para o lançamento do documentário “Olavo tem razão”) que “o objetivo final” da filosofia de Olavo de Carvalho era “salvar as almas, a salvação das pessoas. Todo o resto é secundário” (grifos meus). Acrescente-se que Briguet, numa matéria escrita para o Jornal Gazeta do Povo, reafirma (Briguet, 2024) que o “principal trabalho” filosófico de Olavo de Carvalho foi “ajudar a salvar as almas das pessoas”, isto é, levar “milhares de pessoas de volta para a Igreja”, as quais “estão ajudando a salvar o país” (grifos meus).


Na verdade, a situação é tão dantesca que Ronald Robson (que, embora não seja um olavista, é tido como o melhor aluno de Olavo de Carvalho) chegou mesmo a pontuar que (Robson, 2023, aula 06), se alguém perguntar “qual a filosofia de Olavo de Carvalho?”, seria uma “ingenuidade” falar sobre a teoria da tripla intuição ou do conhecimento por presença, uma vez que, “por mais genial e importante para a cultura, em sentido mais amplo”, elas são “coisa pequena, um elemento de um objetivo que é muito mais nobre, que não está dado em teorias expressas assim ou assado, que é mobilizar a personalidade do indivíduo para que ela seja robusta o suficiente para perceber as coisas de maneira profundamente pessoal”, ou seja, “tudo o que ele [olavo] se esforçou para fazer foi deixar as coisas claras novamente, deixar espaço para que possa haver reais discordâncias” (grifos meus).


Assim, as problemáticas da prática filosófica carvalhiana (tais como a epistemologia filosófica, a ontologia do ser, a metafísica da ordem, a fenomenologia da consciência, a epistemologia científica, a metafísica do ser, a ontologia axio-antropológica, etc) são censuradas para dar lugar a uma visão simplificada e acessível de Olavo de Carvalho, isto é, a visão de que a filosofia dele seria o “ponto de partida” para qualquer cidadão começar a entender sobre cultura geral e “compreender melhor o mundo”.


Ora, se Olavo não formalizou o seu próprio filosofar (parto aqui do sentido de formalização dado por Mário Ferreira dos Santos, isto é, uma formalização lógica, ontológica ou vivencial, que o epistemólogo Mario Bunge entende como proposicional, contextual e teórica), e se a Imbecilidade Coletiva de olavistas não só não está fazendo este trabalho, como também está impedindo qualquer tentativa nesse sentido, os detratores podem livremente dizer que Olavo de Carvalho não tem uma filosofia, mas sim um projeto político.


Para que um filósofo não-sistemático seja plenamente compreendido (ou, pelo menos, estudado corretamente), é necessário que os estudiosos cerquem e ‘cavem’, por todos os lados, as problemáticas filosóficas que estão subentendidas na propositura do filosofar dele, até o ponto de transparecê-las e tensioná-las num paradigma ou estrutura relacional.


Desse modo, os estudiosos fariam aquilo que o epistemólogo Thomas Kuhn chamou de estipulação do padrão científico pelo qual possibilidades teóricas podem ser formuladas, descritas, desenvolvidas e aceitas (Kuhn, 2002), consolidando, pois, um elevado estágio ou patamar de parametrização em torno da filosofia carvalhiana, o qual não admitirá discussões abaixo daquele nível. Essas pessoas seriam, pois, responsáveis por dimensionar o grau de importância que a prática filosófica carvalhiana teve na História da Filosofia, ou seja, que legado ela deixa para a História da Filosofia, bem como para as questões filosóficas posteriores.


Em vista disso, os estudiosos observariam os fenômenos que são correspondentes aos conceitos gerais carvalhianos (como, por exemplo, os 4 discursos, Unidade do conhecimento na Unidade da consciência, Tripla intuição, Guerra Cultural, Paralaxe Cognitiva, Globalismo, etc), precisando e avaliando, por sua vez, os seus fundamentos reais, de tal forma que os detratores e os propagandistas (a Imbecilidade Coletiva de olavistas) seriam impossibilitados de tratar qualquer ideia de Olavo sem levar em consideração o estágio da discussão que formulou os fenômenos, questões, linhas de investigação, problemáticas e referências metodológicas, as quais o conceito condensado tenta descrever.


Como Olavo de Carvalho não tem tais estudiosos, a obra filosófica dele fica à mercê da distorção propagada pela Imbecilidade Coletiva de olavistas, os quais serão, por isso mesmo, os grandes responsáveis por destruí-la.


TS: É particularmente interessante a abordagem do Jornal Cidadania Popular de se expor e compor-se segundo a linha decadialética de Mário Ferreira dos Santos, e que o jornal o tenha como pilar não só de assunto, mas de estrutura filosófica, fazendo com que a filosofia ferreiriana seja incorporada no cenário de debate cultural como peça viva de compreensão (o que Olavo de Carvalho muito incentivara ao pôr ele e outros três intelectuais de meados do século passado no quarteto de colunas de uma possível cultura superior brasileira restaurada). Quais são os desafios para promover a filosofia de MFS? E acha que Olavo seria a quinta coluna desta estrutura?


RM: Pois bem, foi de Ronald Robson a ideia de que Olavo de Carvalho se incorporaria aos quatro pilares do pensamento brasileiro (que foram equacionados na obra “O futuro do pensamento brasileiro”), compondo, pois, um quinto pilar. Como se sabe, tenho inúmeras divergências com Robson, mas, nesse caso, a visão dele está correta. Entretanto, eu penso que essa classificação ainda não dá conta de dimensionar o real tamanho e efeito de Olavo de Carvalho.


Para equacionar os quatro pilares da cultura brasileira, Olavo balizou a questão segundo contribuições que, “se o povo brasileiro fosse varrido da existência”, seriam capazes de “comparecer em nosso nome ante o trono do Altíssimo”, sobrevivendo, pois, “à passagem dos séculos” (Carvalho, 1997).


Em vista disso, Olavo metrificou 4 áreas de avaliação: (i) “abrangência sintética da totalidade temática de um determinado campo de conhecimento”, até o ponto culminante do autor; (ii) “unidade orgânica” de princípios que coerem “a vastidão do campo abrangido”; (iii) pensamentos “sem similares em qualquer outra língua ou cultura” e (iv) obras que “falam aos homens de todos os quadrantes”, de modo que “somente através delas entramos plenamente no diálogo universal dos homens” (Carvalho, 1997).


Ora, da mesma forma que podemos metrificar objetivamente Mário Ferreira dos Santos como o maior filósofo do século XX, podemos afirmar que Olavo de Carvalho foi o maior filósofo do século XXI. Nesse sentido, ele não só preenche os requisitos para cumprir a visão classificatória de Robson, como também a suprassume. Obviamente, nesta entrevista, não será possível detalhar a criterização epistemológica da afirmativa, mas tentarei esboçar um quadro epistemológico.

Kuhn entendeu que a “ciência normal” obedece paradigmas, ou seja, “regras, concepções prévias ou convicções estabelecidas” que determinam e delimitam os problemas que são acessíveis, as soluções que são aceitáveis e os passos necessários para obtê-las (Kuhn, 1998). O paradigma é, portanto, uma categoria de problemas que a comunidade admite como científico, quer dizer, como medidas seguras ou critérios firmes para testar (montar) resoluções. Todavia, quando um fato novo é descoberto, Kuhn constatou que instaura-se uma espécie de “crise” ou “anomalia” no paradigma, a qual será, pois, reconhecida como uma violação de expectativa e nitidez da ciência normal.

Nesse caso, os cientistas tentarão “ajustar expectativas, adaptar categorias conceituais, instrumentos e técnicas”, de tal forma que o “anômalo” se converta em algo previsto e esperado. Contudo, se a anomalia ainda assim “resistir” a implementação de novas abordagens, ou mesmo ao “relaxamento das regras”, a crise não somente obscurecerá o paradigma, mas também criará uma “emergência de transição para um novo paradigma” e uma nova área de estudos (Kuhn, 1998). Kuhn chamou, pois, essa “transição” de “revolução científica”, isto é, a mutação ou substituição do paradigma exemplar da ciência.


A partir disso, pode-se afirmar que Olavo de Carvalho revolucionou cientificamente o paradigma da prática filosófica do século XXI, caso que pode, pois, ser verificado segundo 6 eixos de sustentação:


(1) Epistemologia filosófica: eixo principiador unificante e determinante da prática filosófica carvalhiana, o qual redefine não só o que é a ciência filosófica (a filosofia), como também o que é a prática dessa ciência;


(2) Epistemologia científica: eixo que redefine e reformula o que é o ato científico e suas condições;


(3) Fenomenologia da consciência: eixo que paradigmatiza o ato de consciência como a substância do próprio método filosófico;


(4) Metafísica da ordem (como mencionei, não conseguirei esgotar as devidas classificações. Para o leitor interessado numa explicação mais detalhada sobre a metafísica da ordem, ver: Medeiros, 2024);


(5) Metafísica do ser: (para o leitor interessado numa explicação mais detalhada sobre a metafísica do ser, ver: Medeiros, 2024);


(6) Ontologia do ser: eixo de máximo grau evolutivo da prática filosófica carvalhiana, o qual redefine o campo de estudo da ontologia para o estudo do ser enquanto ser intrinsecamente e indissociavelmente cognoscitivo, ou seja, estudo do ser enquanto forma cognoscitiva de ser.


Por isso, a prática filosófica do século XXI, seja ela qual for, passará necessariamente e apoditicamente pelos eixos paradigmáticos da filosofia carvalhiana, de modo que toda a filosofia do presente século será, em alguma medida, determinada pela revolução filosófica de Olavo de Carvalho, feito que, por sua vez, nenhum dos seus concorrentes diretos chegou perto de realizar.


Quanto ao Mário Ferreira dos Santos, uma das maiores dificuldades de promover a dialética numérico-simbólica da Enciclopédia de Ciências Filosóficas e Sociais ferreiriana é que o leitor não consegue compreender um dos livros lendo apenas aquele livro, sobretudo se a leitura for feita fora da ordem numerológica. O filosofar ferreiriano é um arco circular-referente, em que o todo se faz presente na parte (uma vez que arrasta circularmente uma parte em referência a outra parte, bem como cada parte ao arco do todo), e a parte se faz presente no todo (uma vez que o todo é o círculo composto da referência de cada parte à outra).


Portanto, para compreender a filosofia ferreiriana, é preciso que o estudioso chegue numa altura ou enriquecimento intelectual que o permita enxergar a grandiosidade e tamanho da experiência filosófica de Mário Ferreira dos Santos, o que exige, por sua vez, um esforço tremendo, um estudo profundo e rigoroso. Para conseguir ver o degrau que MFS galgou na história da filosofia, bem como o objeto sobre o qual ele versou, o estudioso tem que tentar subir num nível intelectual que o capacite a lidar com o filosofar ferreiriano (tarefa que, infelizmente, a intelectualidade direitista nunca conseguiu cumprir).


Thiarles Soares: Então, pode-se dizer que o Jornal Cidadania Popular pretende restaurar aquela antiga ligação entre a Alta Cultura e a camada popular por meio de trabalhos extra-acadêmicos; pode-se mesmo acrescentar que o Jornal fomenta uma produção acadêmica fora da academia, seguindo assim um ideal do próprio Olavo de Carvalho quanto à natureza de uma verdadeira educação, o de reunir os interessados no conhecimento (que ele expressara igualmente naquela entrevista para a Rede Vida em 2004 já mencionada). Mas olhando desde fora, e vendo as barreiras culturais importantes do Brasil, que é um país bacharelista, como expressava Lima Barreto e Olavo de Carvalho tanto insistira em reafirmar esta denúncia em seus trabalhos, o grande desafio seria provar a qualidade do rigor metodológico da produção acadêmica fora da academia, superior a ela, ou mesmo alheia, no sentido de fazer o que ela deveria fazer. São muitos os desafios de um jornal cultural para o Século XXI. Como o jornal intenta “furar” esta barreira cultural importante do Brasil?


Rodolfo Melo: Penso que um Jornal Cultural deve ter em conta aquilo que os marxianos denominam de “Educação popular”, ou seja, uma relação “ambígua de continuidade e descontinuidade” institucional, de “auto-organização e autonomia dos próprios indivíduos que se envolvem na articulação pedagógica extrainstitucional”, na “formação pela autocrítica” (Loureiro; Mussi; Ouviña, 2024), a qual processa-se, contudo, por meio de discussões rigorosas e metodológicas (de maneira institucional, portanto) sobre a cultura cotidiana mais ampla e abrangente, como também se autocorrige e se autorrevisa (de maneira extrainstitucional, portanto) na própria recapitulação da memória sociocultural.


Tematizando a problemática do marxiano Sérgio Lessa, a tarefa de um Jornal Cultural é incorporar uma criticidade (crisis) axiológica no meio sociocultural em que estamos inseridos, trazendo, pois, à tona os processos inconscientes que determinam os valores de nossa vida cotidiana. Para rompermos com o bacharelismo da cultura brasileira, é preciso rompermos, por sua vez, com a prática inconsciente de valores pela qual a vida cotidiana se organiza, ao ponto de colocá-la sob “um novo filtro” avaliativo, sob “uma nova escala valorativa” (Lessa, 2014).

Como Olavo lecionava, criticar legitimamente o meio sociocultural é colocar-se, de algum modo, acima da sociedade, no sentido de “ver nela algo que ela mesma não vê” (Carvalho, 2001), atingindo, portanto, um nível de consciência que está “acima do nível de consciência que aparece nas discussões públicas”. A tarefa crítica de um Jornal Cultural é, nesse sentido, posicionar o conjunto social sob a perspectiva maior de um observador, o qual julgará o objeto social por meio de um valor de consciência (extraído de uma memória sociocultural) que se sobrepõe ao interesse social vigente.


Decorrente disso, a tarefa concreta de um Jornal Cultural é negar a difusão de “conhecimentos empobrecidos, fragmentados, simplistas, incoerentes, passivos e mecânicos” para a camada popular, e positivar, por sua vez, um processo metodológico de pesquisa capaz de “elevar a camada popular do senso comum à consciência filosófica”, ou seja, a uma “concepção unitária, coerente, articulada e cultivada” (Saviani, 1986). Como realizar isso? Ora, estudando metodologicamente os nossos grandes autores, a nossa memória sociocultural, de modo a parametrizarmos substancialmente as problemáticas que estão contidas na concepção de mundo (método) deles, permitindo-nos, portanto, objetivar um novo ato de consciência histórica-social.


Reinterpretando, pois, a lição de Lessa para o nosso campo, diria que “não há nenhum limite” que nos impeça de tomar “o conhecimento produzido na universidade” (Lessa, 2014), ao ponto de nos apoderarmos rigorosamente, por meio dos métodos ortodoxos de nossos autores, “do melhor da ciência e filosofia burguesa” (acadêmica, portanto) para discuti-la, problematizá-la, criticá-la e “superá-la”. Isso significa que, para superarmos o bacharelismo acadêmico (sem, contudo, termos de desprezar a pesquisa acadêmica), devemos buscar um “estudo ortodoxo” de nossos autores, quer dizer, uma parametrização de “rigorosa coerência dos pressupostos e fundamentos teóricos” (Lessa, 2014) deles.


Cumpre-nos, dessa forma, realizar um estudo cultural que, partindo da ortodoxia de pressupostos dos nossos autores, sintetize (paradigmatize) uma rigorosa experiência consciente sobre o meio sociocultural em que vivemos, permitindo-nos, portanto, compreender o processo evolutivo que a cultura passou até aquele momento, bem como a incidência das possibilidades históricas que, de certa forma, fazem-se presentes.


Para superarmos o ‘bacharelismo cultural’, bem como a ‘plataformização cultural’, propomos um Jornal Cultural nos moldes daquilo que Saviani chama de “ensino de extensão”, ou seja, uma contínua “articulação do ensino [formação] universitário com a sociedade” (Saviani, 1986), que não somente transmite e difunde saber (“verdades já descobertas”), como também “produz novos conhecimentos”, os quais, por sua vez, incorporam-se e integram-se na esfera do saber cultural (enquanto memória sociocultural).


TS: Alguns dizem que a cultura mercadológica, isto é, a cultura em si como um meio de empreendimento comercial, é um fenômeno importante e até necessário de se existir, apesar da possível corrupção ou mediocridade intelectual que pode surgir daí, porque serve de estímulo às classes mais populares e contrafeitas à alta cultura de se aproximar dela. Contudo, vemos também um indiferentismo do público que tolera o medíocre em nome do “tolerar o menos pior”, podemos notar um indiferentismo da parte dos mesmos “intelectuais” que sabotam e mesmo abortam vocações intelectuais profundas que estão presas naquilo que costumam chamar de “espiral do silêncio”, espiral que desta vez é realizada já não só pela esquerda, mas pela própria direita brasileira. Como você e o Jornal Cidadania enxergam problematizar isto abrindo a perspectiva deste público “viciado” nesse modelo mercadológico?


RM: Pois bem, a lógica da plataforma desloca e negocia (ajusta), através de um fluxo permanente de produtos-informacionais, o desejo racional subjetivo, de tal forma que dessubjetiva sujeitos, ao mesmo tempo em que constitui e produz sujeitos (corporeidade e consciência) por meio de mercadorias-informacionais. Desse modo, a lógica da plataforma gesta uma racionalidade de mercadorias, isto é, um sujeito que somente racionaliza-se (entende-se) como sujeito por meio da expansão e generalização da utilidade e benefício (valor) da mercadoria-informacional para si mesmo.


Isso significa que, ao simplificarmos a vida intelectual para o cidadão comum, o pai de família, o homem do dia a dia, sem que, antes, tenhamos formado as devidas criterizações das problemáticas e discussões de nossa memória sociocultural, estamos plataformizando não somente o cidadão, mas também o ambiente intelectual como um todo. Quando, numa tentativa de nos comunicarmos com o cidadão comum, simplificamos a cultura, estamos, na bem verdade, prendendo e fixando a subjetividade (corporeidade e consciência) do cidadão numa estrutura lógica-informacional reexecutável.


A simplificação informacional busca somente o conteúdo que possa acessar (ser possível e demandável para) algum aspecto de vida do cidadão comum, de modo que a informação seja reexecutada (trabalhada e acrescida) no dia a dia dele. Nessa lógica-informacional, tentar produzir pesquisas sobre o ser como ato em Lavelle, sobre a epistemologia filosófica de Olavo de Carvalho, sobre a antropologia axiológica de Miguel Reale ou sobre a dialética numérica-simbólica de Mário Ferreira dos Santos seria em vão, pois a plataforma racionaliza a simplificação informacional como lógica constitutiva dos afazeres diários do cidadão, ou seja, mercadoria-informacional que o cidadão aplica na existência diária dele.


Tornar pais ou mães de famílias leitores do “O mínimo sobre Olavo de Carvalho” seria mais importante do que formar pesquisadores carvalhianos, uma vez que os pais de famílias reexecutariam a lógica-informacional da obra para as conversas diárias, para o casamento, para a criação dos filhos, para a rotina de trabalho, para as personalidades deles, etc. Dessa forma, o iniciante será permanentemente subordinado ao circuito estrutural da lógica-informacional simplificada, como, por exemplo, a infinita série do selo “O mínimo” da Vide Editorial, de documentários da Brasil Paralelo ou mesmo de Podcasts ‘culturais’ (que o permitiria ler enquanto está no ônibus ou assistir enquanto lava a louça ou faz esteira).


Thiarles Soares: Queremos agradecer a você pela sua participação nesta série de entrevistas sobre o quadro da cultura brasileira. Cremos que nossos leitores foram enriquecidos não só com análises profundas e apuradas, como também alicerçadas na busca de uma vida intelectual autêntica. Desejamos a você ao Jornal Cidadania Popular êxito em suas jornadas.*


Você pode acompanhar o trabalho do Jornal Cidadania Popular e do editor-chefe Rodolfo Melo pelos seguintes links:

Instagram: https://www.instagram.com/jornalcidadania/ ou jornalcidadania

Youtube: https://www.youtube.com/@JornalCidadania ou @Jornalcidadania


*Nota: As opiniões e análises aqui emitidas não necessariamente correspondem a opiniões da Casa Editorial da ENA ou do entrevistador, mas são de cunho pessoal do entrevistado. Agradecemos a compreensão e boa leitura!


Referências:

BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas linguísticas. 2. ed. São Paulo: Editora da

Universidade de São Paulo, 2008.

BRIGUET, Paulo. Obrigado, Olavo de Carvalho!. Gazeta do Povo, 16 Out. 2024. Disponível

CARVALHO, Olavo de. O futuro do pensamento brasileiro: estudos sobre o nosso lugar no

mundo. Rio de Janeiro: Faculdade da Cidade Editora, 1997.

CARVALHO, Olavo de. Educação liberal. Rio de Janeiro: [s.n.], 2001.

JAY, Martin. A imaginação dialética: história da Escola de Frankfurt e do Instituto de

Pesquisas Sociais. Rio de Janeiro: Contraponto, 2008.

KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. 5. ed. São Paulo: Editora

Perspectiva, 1998.

KUHN, Thomas S. El camino desde la estructura: ensayos filosóficos (1970-1993).

Barcelona: Paidós, 2002.

LESSA, Sérgio. O revolucionário e o estudo: por que não estudamos?. São Paulo: Instituto

Lukács, 2014.

LOUREIRO, Isabel; MUSSI, Daniela; OUVINÃ, Hernán. Gramsci, Rosa e a educação

popular. In: Gramsci e Rosa: educadores populares, 09 Set. 2024, São Paulo: Livraria Tapera

MEDEIROS, Rodolfo Melo de. O filósofo Olavo de Carvalho em sua prática filosófica: uma

breve introdução. Jornal Cidadania Popular, João Pessoa, 06 Mar. 2024. Disponível em:

breve-introducao/.

ROBSON, Ronald. Introdução à filosofia de Olavo de Carvalho. 22 Ago. 2023, aula 06 [O

que é - e o que não é - conhecimento por presença].

SAVIANI, Dermeval. Ensino público e algumas falas sobre a universidade. 3. ed. São

Paulo: Cortez; Autores Associados, 1986.

STUART, Jeffries. Grande Hotel Abismo: a Escola de Frankfurt e seus personagens. São

Paulo: Companhia das Letras, 2018.

WIGGERSHAUS, Rolf. A Escola de Frankfurt: história, desenvolvimento teórico,

significação política. Rio de Janeiro: DIFEL, 2002.

Outras referências:

Olavo de Carvalho, Entrevista para a Rede Vida (Tribuna Independente), 18 de Outubro de 2024

 
 

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